Friday, January 12, 2007

Montreal's indie scene..

Está a acontecer algo de extraordinário em Montreal, no Canadá. Não sei bem o que é que é, mas está. Tem que estar. Como é que de uma cidade com um milhão e meio de pessoas saem, no mesmo espaço de tempo, bandas como Arcade Fire (que só por si já bastava!!), Wolf Parade, Islands, Sunset Rubdown, The Unicorns, Metric, Stars, só para citar algumas? Como? Como é que isto se explica?

Pelo que sei, há um bairro chamado Quartier Latin onde tudo se passa. Não sei como é, nem como imaginá-lo. Vejo, sem critério que não as notas que soam pela minha cabeça, ruas estreitas e montras com discos de vinil. Guitarras e baterias em segunda mão expostas sob preços em pedaços de cartão, casacos dos anos setenta trocados por saxofones enferrujados. Vejo cervejas a transbordar e acordes a cada esquina. Centros sociais de portas abertas, concertos independentes a cada três passos. Vejo gente nova a entrar com sacos de supermercado em casas de dois e três andares, com pequenas escadas e janelas a dar para a rua. Nas paredes, cartazes anunciando o próximo concerto e mostra de cinema. As pessoas são magras e têm o cabelo meio comprido mas ordenadamente desgrenhado. De vez em quando, passa um grupo de amigos com cervejas na mão, barbas mal feitas e camisolas às riscas roxas e brancas. Todos têm um blazer escuro por cima, e calças rotas.

Quem será aquele careca de óculos escuros e t-shirt amarela. Porque é que tem um ténis de cada cor e está a tocar flauta no meio da rua?!

Há crachás de todas as cores e casais apaixonados. No Quartier Latin, toda a gente ri. Metade das pessoas passeia-se com um iPod, uma trompete ou uma viola acustica. Há dezenas a tocar nas rua e nas esplanadas cheias de trocas de impressões. Em mais nenhum sítio do Mundo o chão adormece tão sujo com panfletos, jornais de música e anúncios de festas independentes.

As empregadas dos bares são baixinhas e muitas usam all-stars. Os mais giros são às bolas encarnadas e amarelas. A dona calça 35 e chama-se Justine. Serve cocktails quando não está a ensaiar nas traseiras da loja de roupa usada do velhote sueco que vive em Montreal há 10 anos. Justine diz que se inspira para escrever as suas canções entre as cachecóis usados por nova-iorquinos de outras décadas e camisolas aos losangos inglesas que o Jakob Ullevat vende na sua loja.

Na música que os amigos de Justine mais gostam e que ela compôs para o aniversário de um bar na esquina de sua casa há uns meses, uma frase ecoa deslavada através das guitarras do namorado de Justine e do seu primo Mark: “What’s the green dot under that seagul’s wing in the sky? Is it you, brother, that’s what you meant when you said you were out to fly?”. Toda a gente canta isto nos concertos com Justine, e ela sorri.

Quand o Quartier Latin acorda, o ar fresco da manhã arrasta nas suas partículas geladas I’ll believe in anything dos Wolf Parade, e todos saem à rua com os seus instrumentos, em busca do acorde que os leve aos ouvidos uns dos outros. Nas primeiras horas da manhã, tocam e soam instrumentos num frenesim descontrolado, que dura horas e horas, sem parar para almoço nem para jantar, sem reparar que a noite cai e os copos de plástico se esmagam nas mãos suadas, um frenesim eléctrico e esvoaçante, que se funde nele próprio e nas paredes dos prédios, criando uma tal vibração que, de tempos a tempos, cá na Europa, um arrepio me passa pela espinha e penso: “Meu Deus, está a acontecer algo em Montreal. Que faço aqui à uma da manhã no computador da sala?”

12 comments:

Lorena said...

Gostava de viver num sítio assim, com toda essa energia e sonoridade.

Por cá, também temos algo, Buraka Sound Sistema, Sam The KID, Pacman, Valete, Tekilla, GQ, etc.

É outra coisa, mas não quer isto dizer, que seja pior.

Miguel Costa said...

Excelente texto, a viajar sem sair da própria sala!

Agora (desde já as minhas desculpas), um eventual paralelismo, mais nerd (a época de exames está à porta...), com a tua "viagem":

"A business cluster is a geographic concentration of interconnected businesses, suppliers, and associated institutions in a particular field. Clusters are considered to increase the productivity with which companies can compete, nationally and globally. "(wikipedia)

seabra said...

Felizmente sei o que é essa cidade e sei o que é esse bairro!

Sugestão: ir sem pensar!

Docinho said...

Que engraçado que é ler Luís Lorena em dissertações sobre o hip hop nacional. Pacman ao invés de da Weasel? Andas a ler a tua blitz!

Não sei bem porquê mas algo me diz que o Luís, Guimarães desta feita, não conhece bem Buraka Sound Sistema, som com o qual infellizmente me vi forçado a acordar... A prova de que ser diferente nem sempre é bom!

Mas não sei, na volta o Sirocco, esse senhor excêntrico e especial à sua maneira, chega ao quartel general da PT, lá ao departamento de indivíduos extremamente banais no que toca a nível de QI, e contempla os colegas com um som de Tekilla ou até dos Kalibrados. Imaginar essa cena já me fez a manhã!

El-Gee said...

nao sei bem o que é que Buraka Som Sistema (BSS) tem a ver com Montreal, mas obrigado pela opinião. Já agora: não gosto de BSS, como nunca gostei.

Docinho said...

Confesso que não conheço nenhum desses sons oriundos de Montreal, tirando Arcade, claro, mas por alguma razão saber que vêm do Canadá deixa-me meio reticente. Vou sacar uns e ver o que valem!

m said...

Lol
Buraka Som Sistema tem graça ver ao vivo ou ouvir uma ou duas vezes, isto para quem gosta de algo diferente e nunca tenha ouvido nada designado como "kuduro progressivo", mais que isso acho que cansa um bocado.

Quanto a post, gostei imenso do texto, mas tenho um apontamento a fazer ao el-gee... os Metric sao americanos e são sediados no Canadá, não em Montreal, mas sim em Toronto.
É apenas uma pequena observação:)

De resto tenho a acrescentar que há outros cantos Canadianos onde ecoam boas bandas, como By Divine Right, Broken Social Scene (sei que já conheces) e Feist - também todos de Toronto.

The New Pornographers e The Organ (que acabaram recentemente), de Vancouver.

E de Montreal, para além dos que referiste, também há os The Dears, The Stills e The Lovely Feathers.

Não sei se conheces todos, mas ficam aqui as sugestões, pq sei q gostas de descobrir coisas novas.

Mr B said...

estou apenas a testar
desculpa, mas n tenho qq opinião sobre montreal.
canada tem bom som tiga, joni mitchell...
e gosto de bbs

Amarcord said...

Eu sugiro q pegues nas tuas camisolas às riscas e vás lá confirmar

...com alguma sorte Justine é dona de um net café.

Bhagavad-gitá said...

bora a montreal?!

Maria Strüder said...

Pergunto eu o que faço eu aqui às 4.05 no portátil no quarto!
Gostava que as pessoas fossem tão plásticas, e gostaria de ver mais as cidades com pequenos núcleos desses mas não.
As pessoas vivem do que a televisão lhes serve, então vivemos de mentalidades criadas a partir de novelas infantis.
Esse mundo é utópico mas tão bonito.
Quanto ao teu comentário no meu blog acerca de me libertar mais para o amor, vejamos, estou só por opção porque lá por estar só não quer dizer que vá a correr ao primeiro que me disser que gosta de mim só para não estar só e ter uma paixão artificial por causa do parecer mal não namorar ou medo de solidão.
Não sou assim, gosto de iniciar algo com alguém quando me interesso por e não porque estou só.
E para me interessar por alguém ...

Bhagavad-gitá said...

tens sorte, tens portátil