Estou convencido de que uma parte da nossa personalidade ou estado de espirito se revela quando temos de soletrar as letras de alguma palvra que queremos que alguem do outro lado do telefone ou de uma recepcao escreva, por exemplo quando trabalhamos num banco ingles e queremos identificar-nos perante um operador de back-office em Bangalore.
- Yes, Luis..Luis yes!
- Ok Sir, L for London, O for Office, U for..
- No, no!! L for London, U for UK, I for Iris and S for Sun,
- L for London, U for UK, I for Iris and F for Fun?
- No, no!, (caralho), L for London, U for Us, I for Iris and S. Ess. For Shining.
- Ok Mr Louis. And you last name Sir?
Suspiro,
E aqui comeca a aventura do Guimaraes, que obviamente pode tanto comecar com um gee for Germany, eew for Uzbekistan, i for India, em for Malta, como pode ir por caminhos completamente diferentes, tipo gee for Gorgeous, eew for Ukranian, i Intimate e em for Massage.
Depende muito do estado de espirito, mas o que tem piada é observar, no a posteriori imediatamente imediato, naquele segundinho entre o acabar de dizer e o pensar na proxima letra, o que nos veio a cabeca quando tivemos de pensar numa palavra.
Eu por exemplo dou por mim a usar imenso paises, talvez porque tenho a mania de olhar para o mapa do Mundo. Hoje saiu-me um Yellow para y e Sun para s. Claramente, uma influencia do tempo em Londres.
E tudo isto se processa no campo do sub-consciente instintivo (expressao nao cientifica); nao é como num date pre-meditado com alguem que mal se conhece, onde as palavras sao medidas e as reaccoes calculadas, ou numa reuniao com os directores da empresa e o nosso chefe. Aqui nao ha estrategias nem causas-efeito, ha um tipo do outro lado da linha que quer mesmo (porque é o trabalho dele, ja que querer mesmo, nao deve querer) perceber como o nosso nome se escreve.
Portanto alarme-se algum leitor (ou leitora. E aqui estava tentado a alertar especialmente as leitoras, mas dizem que hoje em dia é tudo igual. Ate ja se muda de sexo. Bom, dizia eu, alarme-se algum leitor) se der por si, em chamando-se Pedro, por exemplo, a soletrar o seu nome da seguinte forma, (enquanto, hipoteticamente, prepara uma taca de Special K com frutos amarelos)
"Pe de Prazer, E de Enfiar, D de Dedo, R de Rui e O de Orificio. Pedro sim, sou o Pedro e gostaria de encomendar o dvd do Philadelphia para ver hoje a noite"
uma vez que isto pode suscitar em si uma descoberta que o Special K e o seu filme preferido nunca lhe esconderam.
Mas, voltando as mulheres, tema querido mas recentemente pouco explorado neste espaco, imaginemos a Catarina, rapariga conservadora e quase virgem, que se prepara para marcar um voo online num trajecto que pretende fazer (usemos de novo a livre imaginacao) entre o Rio e o Recife para as suas ferias de verao. A Catarina, chegadas as onze da noite e finalmente livre de mais um dia de trabalho intenso, pega no telefone pousado na sua secretaria, liga para o call-centre da TAM e, ignorando que nao ha outra companhia com tantos Fokker 100 espetados na Amazonia, entusiasma-se com o voo que vai marcar e identifica-se, perante uma liberal mas ainda assim boquiaberta operadora chamada Mariela, com o seguinte desembaraco:
C de Cavalo, A de Aberta, T de Tarolo, A de Ansiosa, R de Rebentar, I de Interior, N de Nabo e A Aviar
A Catarina é um excelente exemplo do que a consciencia do poder destas identificacoes pode ter na vida das pessoas. Se se apercebesse do que acabara de lhe sair da sua intimidade, lembrar-se-ia de finalmente aceitar o convite que a sua prima Carla lhe tem vindo a fazer para juntas experimentarem umas aulas de montar.
A sorte da Catarina, no meu exemplo, e isto é porque sinto uma certa compaixao por ela, porque a descoberta que fez nao é para qualquer uma, é que no seu caso o chefe acabara de voltar ao escritorio para recuperar as chaves do carro esquecidas e, ouvindo o seu grito de desespero inconsciente, a convidou para cear em casa dele ate ao dia seguinte de manha.
Se nao fosse ja tarde, acabaria este pequeno ensaio com a historia do Nuno, um modernaco fundamentalista demasiado ocupado para ter filhos com a sua pobre mulher Patricia, pobrezinha, doida por um rebento que acalme o vicio de do marido de jogar futebol todos os dias e o faca desejar mais os prazeres do lar.
Ora bem o Nuno, um Nuno, digamos, porque este nao existe; mas sim, imaginemos entao este Nuno tal como se existisse; O Nuno - Nuno Miguel (Miguel aqui é apelido) - liga entao para o Estadio Universitario para marcar um campo da bola e o responsavel pelas marcacoes, um grunho da Amadora a ressacar a pedrada da noite anterior, confirma o campo em nome do "senhor Bruno Miguel", ja de si um nome assustador, ainda para mais quando o seu falso portador tem a mania que é fino, como o nosso Nuno, de origens humildes mas bem estabelecido hoje em dia.
"Nao, porra", diz o nosso desportista irritado, "Nuno pa, Nuno!! N de Nenuco, U de Ursinho, N de Nascer e O de Ovulo. Nuno Miguel."
"Ok, ok, desculpe la", responde o incompetente do outro lado da linha, apenas para ouvir o silencio de uma chamada desligada de repente, interrompida de rompante pelo pe da Patricia que tropeca no fio do telefone no mesmo momento em que salta do seu sofa para abracar o Nuno e beijar o pai do seu futuro filho - o Vasco, rapaz alto como a mae e activo como o pai, demasiado energetico para alguma vez na vida vir a ter a palavra formada pela primeira letra dos ultimos quatro paragrafos deste texto, por certo indicativas de que o meu corpo - mesmo sem um indiano do outro lado do blog - me esta subconscientemente a pedir descanso.