Wednesday, June 13, 2007

Recapitulando a Cidade do Mexico

Quando o voo desce em direccao a Cidade do Mexico, nao evito o arrepio do costume. A minha barriga voa oca com as descidas espaÇadas para o vazio. O Joao dorme a meu lado e ao lado dele um enorme exemplar de duzentos quilos exibe uma t-shirt "I love NY", que justifica mais tarde estar a usar por ter prometido ao primo que aterraria na Cidade do Mexico com ela vestida. Pobre primo, que imagem o espera.

Mas o que me importa ali e o que vejo do outro lado do vidro: uma imensidao castanha de casas e casas, atraves de montanhas e vales, ininterrupta durante mais de vinte minutos de descida. Ja sabia que a Cidade do Mexico era enorme, mas nunca imaginei que se pudesse estender por tamanha dimensao. A medida que o aviao desce e eu enjoo, os detalhes das casas comecam a aparecer, cada vez mais nitidos, ate as rodas finalmente embaterem na pista e eu respirar fundo e meio arrepiado. Contra os conselhos de todas as pessoas que conheco, estou na Cidade do Mexico.

Curiosamente, nenhum desses conselheiros alguma vez esteve sequer na Cidade do Mexico, e com o passar dos dias ficaria cada vez mais convencido de que mais vale experimentar os sitios pelo proprio pe. Pessoalmente, atraia-me o facto de visitar uma das maiores cidades do Mundo e a maior capital da America Latina. No momento em que aterro, e-me indiferente se a cidade e bonita, limpa, segura ou divertida. Quero saber como e a Cidade do Mexico e essa teimosia chamada curiosidade tem-me proporcionado bons momentos pela vida fora. (E maus, tambem, mas com esses tambem se aprende.)

Fomos recebidos em casa de um amigo num ambiente internacional onde estabelecemos o nosso quartel-general para visitar a cidade e ai passamos momentos unicos, tanto nos finais de tarde como pela noite fora, quando ficavamos em casa, em noites de festa a lembrar os antigos ambientes de Erasmus.

A Cidade do Mexico e um gigante caotico, poluido e descoordenado que eu jamais poderia vir a conhecer num ano, tal e a dimensao e a diversidade de zonas e bairros. Em quatro dias, portanto, a tarefa que tinhamos pela frente nao era conhecer a cidade, mas tentar tirar o maximo partido do tempo la e tentar compreender o que se passa nos varios diferentes bairros.

Aprendemos a usar o lentissimo e sobrecarregado mas moderno sistema de metro e a deixar de ter medo de olhar por cima do ombro a cada dez minutos. Perdemos o medo de andar nos taxis de rua, uns carochas com 30 anos, pintados de verde, guiados por condutores mal encarados mas encantadores. Comemos todos os dias nas bancas, frutas tropicais cortadas a nossa frente, tortas cheias de carne e picante e todo o tipo de vegetais.

Andamos quilometros e quilometros por avenidas poluidas entre autocarros de anos idos e buzinadelas por todo o lado. Entramos e saimos varias vezes da gigantesca metropole para visitar as alucinantes piramides de Teotihuacan e as cidades coloniais de Puebla e Cholula. Ficamos a conhecer os terminais de autocarros da Cidade do Mexico como o mapa de metro de Lisboa. Passeamos pelo chamado centro historico, uma amalgama pouco limpa de edificios coloniais e a inevitavel praca central, igual a tantas cidades espanholas espalhadas nao so por Espanha como por toda a America Latina.

E, no final dia, no inicio do dia seguinte e no proprio momento em que nos metemos num autocarro em direccao a costa, quatro dias depois da nossa chegada, a sensacao que sempre ficava e sempre ficou e a de que estamos numa cidade tao grande, tao inalcancavel, que e dificil fazer o seu retrato ou compreender o seu esqueleto. Cada dia que passa, fico com a nocao de que nada de caracteristico ou muito proprio ha naquela cidade que me permita descreve-la com palavras-chave ou adjectivos.

E enorme, sim, com avenidas de cinco faixas a cada esquina e arranha-ceus colados a barracas. E suja, caotica, cheia de transito, cheia de gente, humida, quente. Pobre, cheia de vozes cinzentas, lixo, paredes pintadas com campanhas eleitorais, fios de electricidade rebentando a chuva, pedintes no chao, bancas de comida, gente que vive na rua. Sem duvida, uma cidade viva, movimentada, onde se sente e vive o ambiente de sociabilidade tao rico e tao presente nas cidades latinas. Mas parece faltar um fio condutor, uma identidade, um tango, um cheiro a cafe fresco.

Fiquei com a sensacao - e que ingenuo sou, a emitir sensacoes depois de passar miseros quatro dias numa cidade de 25 milhoes de habitantes - que passei por uma cidade com tao pouca identidade que, por nao se encontrar essa falta de identidade em mais nenhuma, se torna unica e original.

Foram dias magicos a explorar recantos aparentemente desinteressantes ao olhar turistico, mas representativos daquela que e uma das mais importantes capitais mundiais, enorme poÇo de vidas sofridas, gigantesca amalgama de pessoas que jamais atravessaram sequer a sua propria cidade e berÇo, centenas de anos atras, de uma das mais brilhantes civilizacoes de sempre. os Aztecas.

Por tudo isto, porque estivemos na melhor casa da Cidade do Mexico e porque vale a pena conhecer tambem aquilo que nos desaconselham, passamos quatro dias inesqueciveis na capital do Mexico.

Quando partimos do terminal Autobuses del Sur em direccao a Acapulco, mais em busca de uma noite animada do que de Mexico genuino, debatemos alegres os nossos dias, antes de adormecer ao sabor do vagar lento do autocarro, que demora uma hora a sair da cidade.

Antes de fechar os olhos, sorrio para comigo, contente por saber como e a capital do Mexico, cidade menos bonita do que tantas outras, mas mais verdadeira do que a maioria; alias, como so as grandes capitais sabem ser.

5 comments:

Xavier said...

já falei com o alves entretanto...falou me da tua "aventura" vinda do Panamá...algum comentário?lol
Aterro na Cidade do México dia 19 Outubro.Vamos dedicar 10 dias a explorar esse país.Chiapas, Puerto Escondido e Cancun são prioiridades.Depois, mais 20 dias pa ver o resto da América Central....1 mês de viagem.can`t wait.grande abraço

Lorena said...

Acho que só para ver como e onde o Alves vive, já valia a pena atravessar o Atlântico.

Aliado a isso, ainda teres direito a uma cidade genuína, creio que não se pedia mais nada.

PS - Aposto que dos 25 milhões, a Sarita foi a que te tratou melhor?

Abraços

Xavier said...

xavier aka xico.tive de mudar o user.nao conseguia entrar

nobre said...

A falta de acentos e cedilhas.. Até apostaria que ainda escreveste isso do outro lado do Atlântico, acertei?

Carminho said...

Do pouco que conheco a cidade Mexico, agradeço certos acrescentos que fizeste ao que ja conhecia (ou pelos vistos, nao)...
O descortinar é precioso.
Muitas vezes, está do outro lado, o que fica.
Estou mais atenta a estes ultimos posts, agora que vivo e conheço pilares fundamentais do mundo latino..
Boas Viagens